Entre sangue, armas e a memória: Soldados tieteenses na revolução de 1932.

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Precedentes da revolução

    Após o rompimento com antigo regime político de caráter oligárquico, o novo modelo republicano “reformado” começa a tomar forma no país. A hegemonia política dos estados do sudeste, objetivamente; São Paulo e Minas Gerais, ofuscavam a participação de outros estados e regiões durante a primeira república, muito dita “café com Leite”.

      A busca por maior participação no cenário político nacional, fora culminando insatisfações dentre líderes políticos de outros estados, como Getúlio Vargas no Rio Grande do Sul, João Pessoa na Paraíba, e lideranças políticas de Minas Gerais. Porém, o acordo político entre os estados que regiam esse caráter, consolidaram outra candidatura revezada entre eles, assim o atual presidente Washington Luiz, que deveria apoiar o líder político mineiro, Antônio Carlos Andrada, que rompeu com esse acordo, apoiando outro candidato de São Paulo, Culminando em insatisfações em diversas outras regiões que buscavam por melhor representatividade política no cenário nacional. Assim, outros grupos insatisfeitos com tal regime, começam a ganhar mais força na política, como o movimento tenentista.

     O voto aberto, já entre os eleitores e políticos, era de senso comum que abria excedentes para diversas falhas políticas e consequentemente, sociais, o coronelismo por exemplo; que tomava sua forma pelo fato, de quando o voto era aberto, o controle desses sobre a classe eleitoral, era total, assim, grandes cafeicultores, latifundiários e empresários tomavam o espaço político para assim passar controlar diversas regiões em todo o território nacional.  Grandes oligarquias excludentes, se formaram durante essa primeira república, que evidentemente fora um dos fatores para tamanha insatisfação.

    Até mesmo, as classes militares sofriam com esse efeito, em especiais os jovens de baixa patentes, vislumbrados com um ideal democrático, eram totalmente confrontados a realidade de uma república que favorecia amplamente setores oligárquicos.

    Dada as causas que culminariam insatisfações a diversos grupos, tanto políticos quanto militares, houve uma tentativa de formalização de uma força política para ganhar mediante as eleições, assim, acaba por se formalizando a aliança liberal, da qual não surtirá efeito, sendo ao fim da contagem, Júlio Prestes acabando por vencer.

    A não aceitação dos resultados dos resultados da eleição, culminaram na formação grupos militares em diversas regiões do país, partindo assim, na deposição do presidente Washington Luiz, Impedindo a posse de Júlio Prestes, onde posteriormente, assumindo a presidência da república, Getúlio Vargas acaba sendo empossado.

Efeitos da Revolução de 1930

Com a estrutura política do Brasil centralizada em diversos núcleos esparsos, Getúlio ordenou a revogação da constituição de 1891, assim, começou a governar o Brasil por meio de decretos, sem participação de um poder legislativo, ordenou em que em cada estado Brasileiro, tivesse um mandatário que cumpria seus desejos, porém, ampla maioria deles eram todos, jovens e inexperientes tenentes que participaram da revolução, assim, em pouquíssimo tempo, Getúlio conseguiu centralizar todo o estado brasileiro, sob seu comando, alegando assim, o rompimento da “antiga” república, e a construção de uma nova, em outras palavras, fora implementado um regime ditatorial do poder executivo.

            As consequências começaram a surtir já no início da nova república, os tenentes que do dia para noite passaram a gozar de grandes poderes políticos, mas devido a inexperiência, acabaram agravando o cenário econômico e político, dado também a fatores externos, como a crise de 1929, e assim, legalistas e outras camadas da sociedade, principalmente a paulistas, passaram a olha-los com maus olhos.

            Sempre de início, Getúlio buscou prestigio das camadas populares, pois o modelo populista implementado, havia lhe consolidado uma enorme cultuamento de sua imagem, dado a isso acabou-se ampliando seus poderes políticos, com isso, criou ministérios como; Ministério do Trabalho, Saúde, Educação. A ditadura Getulista fora implementada de forma tão bem consolidada, que reduziu o poder e autonomia dos estados e municípios, culminando um país extremamente centralizado, tudo isso, somente foi possível, mediante a derrubada da constituição Brasileira, em 1931, que seria o fator culminante para a revolução no ano seguinte.

A revolta

            A insatisfação da sociedade paulista eram tamanha, que enorme manifestações já estavam sendo realizadas, em diversos lugares, a nomeação de um novo interventor em São Paulo acirrou cada vez mais os ânimos, os antes apoiadores, como o PRP (Partido Republicano Paulista) e o Partido democrático que que ajudaram a consolidar o golpe de 1930, agora já estava contra o regime de Vargas.

            Ao fatídico dia 23 de maio de 1932, durante uma manifestação de descontentes com o regime, cinco jovens foram assassinados por um grupo militar alinhado ao Partido Popular Paulista, do qual faziam parte do regime Getulista. Assim, Martins, Miragaia, Camargo, Dráusio e Alvarenga acabariam por tornar mártires para o movimento constitucionalista, que culminariam no estopim da revolução. Assim, letras dos nomes dos jovens (M.M.C.D), fora utilizado para fundação de um secretariado independente, do qual encabeçava o movimento constitucionalista criando laços com partidos opositores, e outros setores sociais, como grupos maçons.

            Ao mesmo tempo, o governo provisório utilizaria medidas para instigar outros estados a se opor a São Paulo, onde diversos voluntários se disporão a ir contra as tropas paulistas. Assim composto de diversos voluntários, o exército constitucionalista já tomava forma, que ao dia 9 de julho de 1932, os conflitos começaram.

Tietê e a Revolução Constitucionalista

Como outras cidades de São Paulo, Tietê também aderiu a causa constitucional, os insatisfeitos eram quase a totalidade dos cidadãos tieteenses, com os novos rumos que a república brasileira tomava.

Tietê, 12 de julho de 1932, dia em que o M.M.D.C em contato com os representantes político de Tietê, organizam o chamado, para que fosse atendido o clamor público dos paulistas, em diversos folhetos espalhados pela cidade, todos constituíam de um enorme a fervoroso chamado a todos os cidadãos tieteenses para aderirem a causa. O primeiro fora emitido pelo Partido Democrático, qual era representado por Octávio da Costa Carvalho.

Acervo: secretaria de turismo e cultura


Já seguidamente fora emitido um segundo pelo Partido Republicano Paulista (P.R.P), sobre a representação de Luiz Benedito de Antunes Cardia:

Acervo:  Secretaria de turismo e cultura

Diversos cidadãos se voluntariaram para combater pela nobre causa, e em meio a madrugada do dia 18 de julho de 1932, um trem especial estava à espera dos jovens soldados tieteenses, muito novos, sadios e esperançosos, culminariam em um momento emocionante, entre a tristeza pelas incertezas, até o orgulho de servir perante uma causa maior. O hino nacional ao fundo orquestrado por uma banda musical, e os vivas calorosos, o trem parte sentido à São Paulo, rumo a faculdade de Direito, onde se sediava o quartel general do M.M.C.D. (ALMEIDA, 1970)

Livro de registros dos soldados Tieteenses / Acervo: Secretaria de Turismo e Cultura

Livro de registros dos soldados Tieteenses / Acervo: Secretaria de Turismo e Cultura

Livro de registros dos soldados Tieteenses / Acervo: Secretaria de Turismo e Cultura

Em suma maioria, todos os voluntários eram compostos de jovens inexperientes, e após se apresentarem, foram alocados à 2ª Companhia do 6º B.C.R (Batalhão de Caçadores da Reserva), entre os oficias estava presente, o Tenente Plínio Rodrigues de Moraes. O treinamento militar fora aplicado de forma, extremamente rápida, e já com os princípios básicos estabelecidos, alguns feitos até mesmo somente posimples cartilhas, foram liberados, mas sabiam que o breve treinamento, não era o suficiente para formação de um militar, mas dado a urgência, era o que poderia ser feito naquele momento.


Desfile cívico em homenagem aos soldados / Acervo: Secretaria de Turismo e Cultura

Buri, Agosto de 1932

O 6º Batalhão após passarem pelos treinamentos, foram equipados e partiram para região de Itapetininga dia 27 de julho, assim, em uma estação ferroviária do município de Buri, se deflagram os primeiros conflitos para tomarem o controle da estação ferroviária, Vitorino Carmino, que antes estava sob controle de tropas Getulistas, após uma incisiva onda de artilharia, as tropas constitucionalistas passaram a tomar controle do ponto.

Porém dado, a importância estratégica do local, as tropas opositoras acabaram por receberem reforços, começaram as reinvestidas das tropas federalistas, que foram de encontro com as posições onde estavam alocados o 6º BCR. O confronto havia recomeçado, a artilharia do 6º por sorte havia recebido quantidades extras de munições, nesta posição foram utilizados até mesmo aviões bombardeiros, que atacavam toda área próxima da estação.  Os tieteenses que haviam se incorporado às pressas mal haviam recebido treinamento adequado, e em meio a esse cenário caótico, sua coragem haviam se posto à prova, em toda linha de trincheira montadas pelos soldados, eles utilizariam até a última bala para defender a posição. (Almeida, 1970)  

Exército Getulista que antes tomava controle da estação  Vitorino Carmilo / Foto: Estações ferroviárias / Reprodução

Porém, a ala esquerda da linha, diferentemente das outras, os soldados estavam desgastados e estavam mal conseguindo segurar a posição, que diante disso cede mediante a um ataque massivo de quase dois mil soldados. Sem suprimentos e energia, a tomada das trincheiras se torna um conflito dos mais violentos que se possa imaginar, a cada metro disputado, e já sem munições, a arma branca se torna a única ferramenta entre sobrevivência e a vitória.

Entre Facas e Baionetas era evidente a diferença da proporção militar, seja em números ou em equipamentos. Em carta o capitão Celestino Bastos se pronuncia ao general Kingelhoefel “A sessão de artilharia não tem mais munição, mando-a para retaguarda. Que desproporção! o inimigo nos atirou mais de 1200 granadas e nós respondemos bravamente com as últimas 57”. (Almeida, 1970)

Neste ataque incisivo, acabou por culminar em enormes baixas para as tropas constitucionalistas, e paras famílias daqueles jovens paulistas, muitos mortos e feridos, entre eles haviam jovens tieteenses como: Indalécio Costa, Enock Barreira de Macedo e Luiz Fernandes Diogo, que acabaram por perecer mediante ao conflito, mas não na memória.

Amanhece dia 16 de agosto de 1932...

Reforços das tropas federais chegaram a quase 6000 homens, que fortemente armados e apoiados por 32 canhões, passam a avançar. O que poderiam fazer apenas 850 homens sem munição e mal conseguindo ficar em pé devido ao desgaste? (Almeida, 1970), assim após 2 dias seguidos sob forte fogo, ao 6º BCR, é vencido, sendo forçado a recuar.

Abatidos, não apenas pela derrota, mas por todo o contexto que o cercavam, pois a visão de um próprio conterrâneo de tietê, Indalécio sendo baleado no pescoço e presenciar que seu corpo encontrou o fim em uma trincheira fria e sem vida, seria um abalo enorme para os soldados.

 Indalécio Costa, nascido em tietê em 1908 filho de Luiz da Costa e Dona Francisca da Costa, sempre se demonstrou valente, considerado por seus amigos como, Exemplar.

Indalécio Costa

Luiz Fernandes Diogo, outra vítima, embora ferido por um disparo, arrastou-se debaixo de uma forte chuva, durante a noite do dia 15 para o 16, atingindo um posto da cruz vermelha, entre Vitorino Carmino e Ligiana. Depois de medicado ligeiramente, foi encaminhado para Itapetininga, dando impressão que seus ferimentos não eram graves. Todavia, ao ser transportado para Tatuí e Sorocaba, em cujo hospital de sangue veio falecer.

Jovem nascido em Tietê, filho de Antônio e Otília Diogo foi a campo com apenas 22 anos, seu corpo foi movido para Tietê para ser sepultado sobre grande comoção. (Almeida, 1970)

Luiz Fernandes Diogo

Translado de Seus despojos / Acervo: Secretaria de Turismo e Cultura

Enock Barreira de Macedo, morto também dia 15, porém, o que mais marcou fora sua valentia de forma exacerbada até mesmo entre os soldados, companheiros seu relatavam, que o mesmo ficava de pé frente as trincheiras gritando e desafiando os soldados federalistas, do qual ali mesmo fora acometido por uma bala em meio a seu peito, morrendo no local onde seu corpo seria abandonado , vítima de enorme ingratidão, por apenas não ter nascido em Tietê, seus despojos não foram aqui sepultados. 

Enock Barreira de Macedo / Acervo: Secretaria de Turismo e Cultura

Já outros, foram capturados e presos, como: Deoclécio de Lara Campos, Mario Mazzucatto, José Orestes Corradi, Luiz da Costa Júnior, Salvador Evangelista de Campos, Aureliano Sottovia, Benedito Silveira, Vulgo Peixeiro e Salvador Pereira do Amaral, esse último, ao passar pelas posições ocupadas por eles anteriormente, viu o cadáver de seu amigo, Indalécio Costa, de Bruços, do qual a única coisa que pode fazer, foi virar seu amigo de peito para cima, ali mesmo tendo que o deixar.

Presos, e transportados para ilhas das flores, a única forma que conseguiam de manter contato com sua família, seria pelo correio militar; cartas seriam enviadas para a Typhografia Pires, que distribuía para os familiares tieteenses, assim, mal acreditavam os soldados federalistas, que  todos aqueles soldados encarcerados eram voluntários, que assim, foram mantidos presos, até o fim da revolução.

Acervo: Secretaria de Turismo e Cultura


Cornélio Pires na revolução

Estava em sua casa na capital quando recebe o boletim de um desconhecido, nele estava escrito sobre a convocação dos cidadãos a se levantarem contra o governo federal, dadas as insatisfações causadas pelo rompimento institucional e o risco de emergir um governo autoritário pela falta de uma constituição que não foi estabelecida, todos foram chamados para reunir na praça patriarca, Cornélio naquele momento havia despertado em um interesse fora do comum em participar dos movimentos contra o regime.

“Cornélio sempre possuído de grande estigma política, esteve envolvido em movimentos políticos, já fora anteriormente filiado a partidos como Partido Democrático sendo um dos membros mais ativos.” (VEIGA, 1961)

De início estava doente, não podendo participar das primeiras atividades, posteriormente contrariando a ordem de seus familiares ele vai ao Largo de São Francisco próximo a faculdade de Direito para se alistar aos batalhões. Infelizmente fora recusado e impedido de participar das linhas de frente devido sua idade, nos auge dos seus 48 anos. Porém, isso não o fez desistir de participar da revolução, sendo posteriormente, após muita insistência designado a oficial de ligação entre as unidades de combate, sob posto de Capitão.  

O capitão Cornélio Pires, cumpria a função de visitar as linhas de frente levando alegria com suas apresentações, fazendo revigorar o ânimo dos soldados constitucionalistas. Assim terminando a revolução Cornélio acabou voltando para Tietê, qual passaria a elaborar um livro de contos compostos de histórias vivenciadas durante a revolução.

Chorando e rindo (1932)

Algumas Fotografias

voluntário Luiz Diuzep / Acervo: Secretaria de turismo e cultura

Voluntários tieteenses em Itapetininga / Acervo: Secretaria de Turismo e Cultura



Plinio Rodrigues de Moraes / Acervo: Secretaria de Turismo e cultura

Bando Precatório / Acervo: Secretaria de Turismo e Cultura




Pedido de doações para a campanha constitucionalista / Acervo: Secretaria de Turismo e Cultura

Referências Bibliográficas
Pires de Almeida, Benedicto. Cronologia Tieteense, 1980.

Veiga. Jofre. M. A vida Pitoresca de Cornélio Pires. 1961. O Livreiro.

ALMEIDA, Benedito Pires. A Revolução de 1932. Tietê: scp, 1970

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